dos deuses
eu queria ver
o sangue, o grito,
o choro
e, acima de tudo,
a raiva no peito
pelo desaforo
de sobreviver.
queria vê-los
num ônibus lotado,
entre suor, o tempo,
e a impaciência
do atraso.
dos deuses
eu queria ver
a bebedeira insaciada.
garrafas
secas na mesa,
o vinho vinhando
a madrugada,
pra quando amanhecer,
não ter dinheiro
para pagá-las.
queria vê-los
febriando dengo
ou na cama
se retorcendo
com cirrose hepática,
queria vê-los
saudadiando a amada,
maldizendo
a distância,
comprando passagem
pra pegar a estrada.
dos deuses
eu queria ver
a idade avançada,
o andar fraco
e vacilante,
com o suporte da bengala.
e por fim a morte,
essa deusa indeusejada.
e, como deus,
queria vê-los, somente,
sem fazer mais nada.
André Espínola
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2 comentários:
Linda!
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