Em pensar que
um número
aleatório
entre cento e oitenta e seis mil,
setecentos e sessenta e quatro
e cento e oitenta e sete mil,
trezentos e vinte e dois,
é o meu pai,
o meu mundo
meu e de muitos...
Ele tem um nome,
uma história, uma vida,
uma família a qual ama
e pela qual é amado.
Não é só um número.
Em pensar que
o número depois dele
também é o mundo de muitos.
Quem sabe outro pai,
ou talvez uma mãe, avó, avô
filho, filha, esposa, esposo,
E o número antes dele, que também era
o mundo de alguém, se foi apenas instantes
antes que eu perdesse meu mundo,
Em pensar que cento e oitenta e sete mil,
trezentos e vinte e dois mundos se foram…
Em pensar que nesse luto
nem sequer pudemos nos despedir.
Enquanto isso, nada.
eles não estão nem aí.
E daí? Bando de maricas.
É só verborragia lúdica,
ignorância celebrada,
e uma paralisia genocida.
É foda.
Não são só números,
são mundos.
Não é só tristeza,
é raiva.
André Espínola
In memorian André Vidal Menezes Espinola (19/01/1954 - 21/12/2020) e todas as vítimas do covid-19